Em 6 de maio foi publicado um artigo no site de notícias Business Insider anunciando que a Suíça irá realizar uma votação no mês de junho a respeito de um assunto que continua sendo bastante polêmico: a adoção de um sistema de universal basic income, ou renda básica.
O que é a renda básica, e o que esse conceito tem a ver com o Canadá e com os temas que geralmente são discutidos quando falamos em imigração?
A renda básica, um termo que também e conhecido como “renda básica universal”, é uma forma de sistema de segurança social no qual todos os cidadãos de uma determinada região ou país têm direito a uma quantia determinada, seja por mês ou por ano, como uma renda básica propriamente dita. Essa renda básica seria incondicional, ou seja, não estaria atrelada a restrições ou ‘poréns’. Seria um direito universal do cidadão. A isso, claro, seria somado o salário ou demais rendimentos provenientes de outras fontes, como trabalho, aluguéis, lucros provenientes de empresas e investimentos, apenas para citar alguns.
Muitos dos defensores da renda básica universal partem do princípio de que uma grande quantidade de atividades que hoje geram empregos serão feitas por robôs num futuro muito próximo, fazendo com que a quantidade de empregos diminua. Ainda outra questão surge quando levamos em conta outro argumento a favor da renda básica, que é o seguinte: tendo uma renda garantida e não precisando se preocupar com um emprego do qual não se gosta muito pela simples razão de que é preciso garantir a renda, as pessoas teriam muito mais liberdade para se concentrarem em tarefas que realmente são significativas, tanto para elas mesmas quanto para a sociedade como um todo. Dessa forma, as pessoas teriam mais tempo para se dedicarem a inovações em várias áreas, potencialmente também gerando mais empregos e novas ideias para a economia.
Do outro lado da equação, no entanto, é fato que não existem muitas pesquisas empíricas que examinem ao certo o que aconteceria em uma sociedade se uma renda básica fosse implementada. E permanece a dúvida: o que de fato aconteceria se de repente todos os cidadãos tivessem uma renda mensal garantida, incondicional?
O que esse assunto tem a ver com o Canadá?
O jornal The Globe and Mail publicou uma matéria em abril deste ano comentando a respeito de como a ideia de uma renda básica seria recebida no Canadá. O assunto, que continua sendo polêmico em vários países ao redor do mundo, também gera muita curiosidade em termos de como a renda básica afetaria o estilo de vida das pessoas e também a economia como um todo.
Basicamente, o objetivo do universal basic income seria o de oferecer a cada canadense ou a cada residência uma renda fixa de base, independentemente de qual emprego ou qual status a pessoa em questão possui na sociedade (a renda básica tampouco dependeria de fatores como classe social; seria um direito de todo cidadão). Alguns críticos, no entanto, levantam a preocupação de que a inflação poderá crescer para acompanhar a maior renda total das pessoas, e sugerem que existem maneiras mais fáceis para oferecer segurança financeira para a população, como, por exemplo, aumentando o salário mínimo e fazendo com que o sistema de arrecadação de impostos esteja mais adequado com as necessidades do país ou da região em cada momento da economia.
De qualquer forma, uma renda universal traz consigo o benefício de permitir que os cidadãos tenham mais liberdade para inovar, já que as necessidades primordiais, que são alimentação e moradia, não seriam mais uma preocupação. Dessa forma, um fazendeiro teria liberdade de experimentar uma safra diferente sem precisar se preocupar com eventuais contratempos se a colheita não for das melhores. Seguindo a mesma linha de raciocínio, mais pessoas poderiam estudar e ir em busca de maiores qualificações, eventualmente também contribuindo com pesquisas científicas sobre assuntos inovadores, que podem fazer com que a sociedade como um todo evolua em um tempo relativamente pequeno.
Uma pesquisa de opinião realizada em Ontário mostrou que o governo da província parece apoiar a ideia. Os prefeitos de Calgary e Edmonton também se mostraram interessados no assunto, mas é preciso ter em mente que o Canadá no momento não tem nenhum plano concreto para implementar uma renda básica no país como um todo.
De acordo com o que mostram as pesquisas, caso uma renda básica seja implementada, é muito provável que a quantia total seja consideada baixa, porém seria alta o suficiente para melhorar a qualidade da vida das pessoas que se encontrem próximas à linha da pobreza. Também seria o suficiente para que estudantes possam terminar seus estudos sem se endividarem, e para que casais com filhos pequenos possam aproveitar a possibilidade de que um fique em casa cuidando das crianças enquanto o outro trabalha.
No caso da Suíça, se o referendo for aprovado, cada cidadão teria direito a ganhar 2.500 francos suíços por mês, o equivalente a cerca de 3.318 dólares canadenses (ou cerca de 9.055 reais). Isso, é claro, para um país conhecido por seu custo de vida relativamente alto. É de se esperar que caso outros países estabeleçam uma renda básica, os valores sejam diferentes, estando sempre de acordo com as necessidades econômicas de cada região.
A maior preocupação dos especialistas é que os cidadãos dos países em questão podem acabar não revolucionando a própria economia, não criando novas iniciativas ou novas maneiras de fazer as coisas, já que essencialmente receberiam um salário para não trabalharem. É por isso que a criação de empregos pelos governos continua sendo a estratégia preferida dos críticos à renda básica.
Outro detalhe importante que merece ser mencionado é que em países onde a questão da renda básica foi discutida, a ideia por trás era usar esse valor como substituição para todos os demais benefícios já oferecidos pelos governos. E essa é uma ideia que, a princípio, não parece ser muito favorável para o público, principalmente no caso dos canadenses, que contam com uma intrincada rede de benefícios.
Basic Income Canada Network
Fundada em 2008, o Basic Income Canada Network é uma organização voluntária, sem fins lucrativos e sem afiliações políticas, mas afiliada a uma outra organização conhecida como Basic Income Earth Network, de destaque mundial. O objetivo da organização é promover diálogo público construtivo e com informações fidedignas a respeito do assunto polêmico da renda básica, focando, é claro, no Canadá.
A organização possui quatro frentes, que são inter-relacionadas:
Um pouco de história
Segundo o Basic Income Canada Network, uma forma especial de renda básica foi estabelecida no Canadá em 1967, com uma renda fixa mensal para os idosos. Logo depois, em 1971, foi lançado o Croll Report, um relatório do senado a respeito da pobreza no Canadá, sendo que a renda básica foi recomendada como uma solução viável para o problema.
A renda universal também parece ser uma solução bastante favorável para os territórios canadenses: Yukon, Northwest Territories e Nunavut. Um fato que nem sempre é de conhecimento geral do público é que os territórios do Canadá possuem um custo de vida muito alto em comparação ao custo de vida das cidades do sul do país, e as opções de trabalho e carreira não são tão amplas quanto no sul.
A diferença se faz sentir principalmente nos preços dos itens alimentícios. Segundo a prefeita de Iqaluit, em Nunavut, Mary Wilman, o salário mínimo no território é próximo ao salário mínimo de Ontário, porém, enquanto o preço para 4 litros de leite em Ontário é $3.99, em Iqaluit chega a $12. Segundo ela, a economia baseada em um salário mínimo funciona para o estilo de vida nas regiões do sul do Canadá.
Quanto aos empregos nas regiões do norte, muitos são formas tradicionais de caça e pesca, uma vez que a maioria das indústrias está no sul. Por conta da falta de uma rede básica de suporte financeiro, muitos dos trabalhadores do norte não têm como arcar com os gastos referentes a suas profissões, como, por exemplo, gastos com snowmobiles, gasolina, armas para caça, barcos, ferramentas.
Em Whitehorse a siuação é semelhante. O prefeito da cidade, que fica no território do Yukon, diz que a maioria de seus residentes trabalha em 2 ou 3 empregos apenas para conseguir pagar as contas de casa, e muitas pessoas contam com ajuda de amigos e familiares na questão financeira.
A maioria dos moradores dos territórios do norte do Canadá contam com algum tipo de welfare, ou seja, assitência social ou auxílio financeiro. Mesmo assim, o argumento mais forte é que esse auxílio nem sempre é suficiente. Os territórios parecem concordar que o estabelecimento de projetos pilotos com foco no estudo das consequências sociais e econômicas de uma possível implementação da renda básica seria necessário para estabelecer a sua viabilidade.
Basic Income em Ontário
De acordo com uma matéria publicada em março pelo jornal Huffington Post, o governo de Ontário está realmente considerando estabelecer um programa piloto para a avaliação da renda básica como solução para driblar as questões que surgem da inequalidade econômica.
4 em cada 10 respondentes de uma pesquisa de opinião dizem aprovar a implementação de uma forma de renda básica para a população. 33% da população permanece contrária à ideia. Mesmo assim, a quantidade de pessoas que aprova a ideia em 2016 (41%) é significativamente maior do que era em 2012 (com apenas 27% de aprovação), o que significa que a ideia está germinando bastante na província e parecendo cada vez mais convidativa para os canadenses.
O fator que permanece como quesito central para a indecisão e a contrariedade do público de Ontário é a falta de pesquisas que provem que é de fato uma boa ideia substituir os programas de assistência social já existentes por um cheque mensal distribuído para cada cidadão.
Ainda não se sabe quanto o projeto piloto vai custar nem onde será implementado. Ainda assim, já é sabido que o projeto piloto faz parte do orçamento para a província. Carles Sousa, o ministro das finanças, diz que o projeto será usado para determinar a viabilidade da implementação da renda básica em toda a província no futuro.
Fontes de pesquisa:
Basic Income Canada Network
Guaranteed annual income is a second-best solution to inequality
Approval For Basic Income Jumps In Ontario